Decisão obriga Plano de Saúde a arcar com procedimentos de fertilização in vitro

O Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJ-DF) determinou nesta semana que um plano de saúde deve arcar com todos os procedimentos de fertilização in vitro referentes ao tratamento de um casal com infertilidade. A decisão seguiu o entendimento de que uma vez que a Lei 9.656/98 prevê expressamente que planos de saúde são obrigados a cobrir atendimentos nos casos de planejamento familiar, cabe aos planos custear também tratamentos de fertilização in vitro, mesmo que o tratamento não esteja previsto no contrato.

Para a diretora nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), Marianna Chaves, o entendimento da Justiça foi acertado. "A decisão não poderia ter sido mais coerente com o nosso sistema jurídico. O Desembargador Josaphá dos Santos, antes de mais nada, observou a hierarquia dos atos normativos, respeitando o que diz uma lei ordinária em detrimento do que diz uma resolução", explica.

O casal recorreu ao Judiciário após o plano de saúde se recusar a custear o tratamento. Em primeira instância, o pedido de antecipação de tutela foi negado. Sendo assim, eles recorreram ao TJ-DF, que deferiu a liminar. Em sua decisão, o desembargador concedeu o pedido de tutela de urgência ao reconhecer a necessidade imediata para o início do tratamento. Ele observou que o contrato firmado entre as partes, com base em resolução da ANS (Agência Nacional de Saúde), prevê de forma taxativa a exclusão da cobertura do tratamento de infertilidade. No entanto, explicou que o artigo 35-C da Lei 9.656/98 prevê que é obrigatória a cobertura do atendimento nos casos de planejamento familiar.

Foi considerado ainda que a urgência da medida é necessária dada a idade avançada da esposa (35 anos), que pode agravar a doença e tornar a infertilidade do casal permanente. De acordo com Marianna Chaves, esta divergência entre os contratos firmados e a lei existe porque o consumidor, ao aderir serviços desta natureza, em regra não vai às letras miúdas, até porque não tem obrigação de saber o teor de todas as normas dessa matéria. Deste modo, os planos de saúde colocam as exceções que desejam e esperam que elas sejam cegamente aceitas, sendo válidas ou não.

"Estando essa matéria regulada por lei ordinária que indica que no âmbito do planejamento familiar esses tratamentos são devidos, só podemos dizer que a resolução da ANS está em descompasso com norma hierarquicamente superior. Assim, a cláusula de exclusão deve ser tida por não escrita, ou melhor dizendo, nula, nos termos do artigo 51, I do Código de Defesa do Consumidor, já que importaria em renúncia de direito constitucionalmente assegurado. Além disso, há algum tempo a doutrina especializada no Direito à Saúde vem se manifestando no sentido de que o rol que lá está elencado é meramente exemplificativo e não taxativo. Assim, ainda que essa abusividade não fosse repelida pelo próprio diploma consumerista, haveria outras formas de combatê-la, com recurso ao direito contratual e ao direito constitucional. Mas não é preciso qualquer exercício hermenêutico. O CDC é claro", detalhou.

No entendimento da advogada, a decisão certamente servirá de bom espelho para decisões futuras. Para ela, não há dúvidas de que os recursos às técnicas de procriação medicamente assistida é um meio de se fazer valer o direito constitucional ao planejamento familiar. "Penso eu que, no futuro, nem haja mais necessidade de judicialização dessa questão, com o desaparecimento de cláusulas desse tipo, por serem ilegais e inconstitucionais". Marianna Chaves considera ainda que os avanços do Provimento 52/2016 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) estão alinhados ao artigo 35-C da Lei 9.656/98.

"Se fizermos a leitura correta de ambas normatizações, sim. Nesta decisão específica, estava em causa uma situação de infertilidade, mas esse acesso deve ser assegurado também aos casais homoafetivos que, como par, ainda que não sejam inférteis, não podem se reproduzir naturalmente. Um posicionamento contrário afrontaria violentamente os mandamentos constitucionais da igualdade e da não discriminação. O planejamento familiar é um direito assegurado na lei ordinária e constitucional a todas as pessoas e casais, em uma lógica de pluralismo procriativo que já há algum tempo é visível no Brasil", defende.

Fonte: Assessoria de Comunicação do IBDFAM (com informações de Conjur)